Vida escondida em Nazaré
(Padre José Antônio Bertolin, Oblato de São José)
Jesus viveu toda a sua vida, enquanto estava com seus pais, em Nazaré e não em Jerusalém. Certamente ele não frequentou uma escola rabínica da cidade, mas trabalhou em companhia com seu pai José na carpintaria de Nazaré. Jesus foi educado diretamente por José e teve a experiência de uma grande proximidade com ele. Na convivência com Jesus adolescente, José passou a experimentar a mais profunda docilidade do coração de seu filho, sendo testemunha do clima de afabilidade e do crescimento dele em idade, sabedoria e graça. José viveu na presença de Jesus num clima de contemplação. É pena que os evangelistas não terem tido a preocupação em relatar alguns episódios tão ricos dentro do clima da Sagrada Família.
Foi dentro de sua família que Jesus experimentou a sua condição humana em suas múltiplas facetas. Nela Jesus viveu sua primeira escola de bondade, de compreensão recíproca e de humanidade autêntica. Isto foi tão forte na vida de Jesus que ele, durante o seu ministério público, irá falar sobre a figura do Pai celeste, bom e misericordioso, ensinando os discípulos a invocá-lo como Abbá: é evidente que essa referência estava impregnada pela experiência que teve em sua santa família. A sua acolhida alegre das crianças e a delicadeza com as mulheres marginalizadas na sociedade eram reflexo dos sentimentos de carinho e de respeito por sua mãe e seu pai.
Nazaré foi o ponto da terra escolhido por Deus para a encarnação do Verbo (Lc 1,26), por isso Jesus é qualificado de “Nazareno” porque foi ali que se criou (Lc 4,6) e ali viveu até o início do se ministério (Mc 1,9; Mt 4,13). Jesus, filho de José de Nazaré (Jo 1,45) é o registro do Messias que Felipe apresentou a Natanael. Na cruz Jesus recebeu a denominação de “Jesus nazareno” (Jo 19,19).
O papa Paulo VI enfatiza que “a casa de Nazaré é a escola onde nós começamos a compreender a vida de Jesus, ou seja, a escola do evangelho. Aqui se aprende a observar, a escutar, a meditar, a penetrar o significado assim profundo e misterioso desta manifestação do filho de Deus tão simples, humilde e bonita. Aqui descobrimos a necessidade de observar o quadro da sua estadia entre nós: ou seja, os lugares, os tempos, os costume, a linguagem, os ritos sagrados, enfim, tudo aquilo do qual Jesus se serviu para se manifestar ao mundo”[1].
Nazaré não é apenas o lugar geográfico, mas é, sobretudo, um tempo de graça. O período mais longo da existência de Cristo foi transcorrido no anonimato, mas com a eficácia do fermento na massa. Homem entre os homens, Jesus compartilhou em humildade e obediência a cotidianidade, as instituições, os ritos, o cansaço, a dor e o trabalho, a fim de transformar tudo, purificando e santificando tudo com contato de sua presença redentora. Em tudo isso não podemos deixar de ver ao lado de Maria a presença e a ação de São José com sua função de pai, de esposo e de educador. A submissão de Jesus aos seus pais (Lc 2,51) se deu de uma maneira tal que com ela Jesus santificou os deveres da família e do trabalho ao lado de José; trata-se de uma santificação da vida cotidiana. A Redemptoris Custos enfatiza que “O crescimento de Jesus “em sabedoria, em estatura e em graça” (Lc 2,52), deu-se no âmbito da Sagrada Família, sob o olhar de São José, que tinha a alta função de o “criar”; ou seja, de alimentar, vestir e instruir Jesus na Lei e num ofício, em conformidade com os deveres estabelecidos para o pai“[2].
Em Nazaré, a vida de São José não teve outro sentido a não ser aquele de servir Jesus menino ao qual estava confiada a redenção da humanidade. Para isso ele colocou à disposição dos desígnios de Deus a sua liberdade, a sua legítima vocação humana e a sua felicidade conjugal. José assumiu com toda responsabilidade essa incumbência, exercendo na Sagrada Família a sua autoridade de maneira verdadeiramente exemplar. Isso significa que ele vivenciou juntamente com sua esposa o amor no mais alto grau porque esse foi praticado não apenas em relação ao próximo, mas para com o próprio Deus na pessoa do Verbo encarnado.
O amor de José por Jesus e Maria foi sem reticências e reservas; foi um amor traduzido em generosidade, sacrifício, serviço, dom de todo o seu próprio ser. O lavapés que Jesus realizou no cenáculo, como modelo de serviço, ele o tinha certamente experimentado na casa de Nazaré, onde servir era a regra áurea, a expressão de obediência que todos os seus membros tinham em relação à vontade de Deus.
[1] Discorso a Nazareth, 5 gennaio 1964.
[2] Exortação Apostólica Redemptoris Custos 16.